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terça-feira, 24 de agosto de 2010

A afetividade entre pessoas do mesmo sexo


Diz o poeta Goethe que a homossexualidade é tão antiga quanto a humanidade. Os primeiros registros históricos são datados de mais ou menos cinco séculos antes do nascimento de Cristo. Egípcios, gregos, romanos, possuem casos de homossexualidade em sua história, alguns bem famosos como o general Alexandre Magno e Platão.
Um dos registros mais antigos que se tem de uma relação homossexual é dos deuses egípcios Oros e Seti. Na mitologia Grega, podemos usar o exemplo de Laio, pai de Édipo, que teve um relacionamento homossexual com Crísipo. Quando Crísipo se suicidou por causa deste amor proibido, seu pai, tomado da dor e frustração por este relacionamento e seu final trágico, amaldiçoou Laio a ser traído e assassinado por seu filho, que viria a ser Édipo.
No Egito, como na Mesopotâmia, existiam formas institucionalizadas de homossexualidade. Entre os gregos e romanos, havia a aceitação de relações sexuais entre homens, como demonstração de poder, sem que esses deixassem de ter suas mulheres. Na sociedade ateniense, era natural que um jovem fosse possuído sexualmente por um adulto, porque seu papel na sociedade era de passividade.
Os temíveis exércitos de Tebas e de Esparta possuíam unidades formadas por pares de amantes homossexuais. Essas tropas, capazes de bravura suicida, eram estimuladas por idéias como as de Platão, que achava que um homossexual nunca abandonaria seu amante em combate e procuraria honrá-lo com feitos heróicos.
Mais atualmente, aparecem registros da homossexualidade feminina. Ela esteve na moda em vários períodos no Japão, do século XI ao XIX e na China Imperial, como no século XI. Chegou a ser institucionalizada entre os maias no século XV.
De lá para cá muitas coisas mudaram, em Abril de 2008 o Brasil realizou seu primeiro casamento gay. A cerimônia foi realizada em São Paulo, além de um contrato de parceria oficializando a União Estável entre os dois, Felipeh e Rafael, que vivem juntos há cinco anos, vão realizar uma cerimônia religiosa.
No dia 28 de junho deste ano Belém celebrou o primeiro casamento homossexual do Pará, no dia internacional do orgulho de ser LGBT. Com direito cerimônia oficial e celebração em Boate gay a festa teve protocolo, lista de presentes, alianças e uma festa para convidados ilustres, entre eles políticos, empresários e artistas. Para acontecer a celebração, os casais tiveram que comprovar que já vivem uma relação estável há mais de dois anos, através de testemunhas e documentos de residência, conta em banco, bens patrimoniais e outros. Esse foi um grande passo na capital paraense para a garantia desses e de outros direitos que são negados.
Não é fácil contar a história da homossexualidade, pois ela esteve sempre nos bastidores. O que se pretende é esclarecer questões que fazem parte da humanidade sem declinar a série de vocábulos e expressões utilizados para identificar um fato natural, que sempre existiu, mas que a humanidade insiste em rejeitar: o amor ao mesmo sexo. O preconceito e a discriminação que cercam as variantes que se afastam da sexualidade aceita como correta - pelo simples fato de ser majoritária - levam ao surgimento de denominações que acabam sempre escorregando para o deboche.
No princípio, chamavam-se sodomia as relações de pessoas do mesmo sexo. Seguiu-se a expressão homossexualismo, que foi afastada por significar "desvio ou transtorno sexual". O sufixo "ismo" utilizado para identificar doença foi substituído por "dade", que quer dizer "um modo de ser". Assim, surgiu a palavra homossexualidade, que, na Classificação Mundial das Doenças – CID, passou a nominar: "transtorno da preferência sexual".
Jurandir Freire Costa, com inegável autoridade, denuncia a conotação pejorativa de tais expressões e introduz o vocábulo homoerotismo, pretendendo revalorizar as experiências afetivo-sexuais.
Com essa mesma intenção, mas buscando subtrair o teor sexual dos relacionamentos interpessoais, se criou o neologismo homoafetividade, para realçar que o aspecto relevante dos relacionamentos não é de ordem sexual. A tônica é a afetividade, e o afeto independe do sexo do par.
No passado, casais homoafetivos costumavam viver juntos, mas não exibiam publicamente sua relação como meio de evitar discriminação. Muitos casais agora vivem abertamente e reivindicam a legitimação de seu relacionamento através de casamento simbólico, várias formas de união legal e criação de filhos. O casamento homoafetivo tem sido reconhecido por numerosas religiões e instituições políticas. Além disso, um recente caso judicial em Nova Jersey estabeleceu o direito de os parceiros homoafetivos terem nomes de casados, o que invalidou a política estadual sobre o contrário. A determinação do juiz incluiu o reconhecimento específico da legitimidade das uniões estáveis com o mesmo sexo.
Apesar da semelhanças com a relação cojugal heterosexual os casais homoafetivos possuem suas peculiaridades principalmente entre os casais gays e os casais lésbicas, justamente porque há uma diferença neurológica, biologica e social entre os gêneros. Ou seja, embora cada casal homossexual seja peculiar, algumas generalizações se aplicam e são pontos úteis na avaliação de casais específicos. Não é surpreendente que os casais de gays e lésbicas se diferenciam de maneiras características, exibindo os casais gays comportamentos masculinos mais tradicionais e os casais de lésbicas exibindo mais características associadas a mulheres em outros contextos.
Comparados os casais de lésbicas, os gays tendem a dar maior ênfase ao contato genital, têm atividade sexual mais freqüente, ligações mais frouxas entre sexualidade e envolvimento emocional e intimidade, menos exclusividade nos relacionamentos, maior preferência por autonomia e mais inclinações exploratórias. Estudos anteriores sobre relacionamento homoafetivo masculino enfocavam a recreação descompromissada, e não relacionamentos íntimos duradouros. Pensa-se atualmente que os homens homoafetivos assumam padrões mais recreacionais do que os homens heterossexuais, as mulheres homossexuais ou as mulheres heterossexuais. Conquanto um grau de espírito de aventura sexual possa ou não ser problemático para o casal, os relacionamentos sexuais fora do casal podem trazer tensão ao relacionamento
Os casais de lésbicas tipicamente expressam características femininas, incluindo menor ênfase no contato genital, diminuição mais rápida da freqüência do contato sexual, maior ênfase na intimidade emocional e afeto, mais exclusividade nos relacionamentos e maior inclinação para estabilidade no longo prazo dos relacionamentos. Muitas mulheres homossexuais têm relacionamentos heterossexuais, casamentos e filhos. Algumas mulheres retornam aos relacionamentos heterossexuais após a dissolução de um relacionamento homoafetivo.
A natureza e o grau de compromisso do relacionamento variam de casal para casal. Os relacionamentos homoafetivos, como os arranjos heterossexuais, são diversos. Podem ou não envolver a vida sob o mesmo teto; podem ou não envolver exclusividade; podem ou não ser exclusivos de envolvimento heterossexual formal ou informal. Podem ser para a vida toda, por curto tempo, em série ou entre outros relacionamentos. A característica de definição é que os indivíduos se identifiquem como casal, independente da nomeclatura, conceituação e do sexo do parceiro.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

TECNICA DE AVALIAÇÃO FAMILIAR - ARTE DIAGNOSTICO

Aspectos importantes:
O Arte-Diagnóstico Familiar foi desenvolvido por Hanna Kwiatkowska, professora de arte-terapia da Universidade George Washington e da Washington School of Psychiatry, nos Estados Unidos da América. A autora criou uma técnica de avaliação, utilizada no período de entrevistas, cuja linguagem terapêutica baseia-se em desenhos com temas pré-determinados. A família expressa, por meio da arte, sua capacidade de criatividade, de flexibilidade e de integração, apresentando sua distribuição de papéis e suas formas de comunicação, assim como a dinâmica de seu funcionamento.
O sintoma de um membro deverá ser considerado um sintoma da patologia familiar. Recorrer às técnicas de avaliação diagnóstica nas entrevistas preliminares vai além do objetivo de diagnosticar a patologia da família, uma vez que elas também são um facilitador para a adesão da família à psicoterapia. O psicoterapeuta deve sentir-se confortável em aplicar as técnicas de avaliação, escolhendo qual ou quais serão aplicadas, de acordo com o contexto de cada família. A finalidade da aplicação deve estar clara para o profissional: avaliar a interação familiar, conhecer a história da família, constituir um vínculo terapêutico, elucidar a demanda familiar, estabelecer a adesão dos membros ao tratamento e implicar a família na efetuação de mudanças.
A construção desse instrumento foi gradual, passando por diversas modificações e sendo submetido a várias pesquisas. Somente após muitos anos de estudos, finalmente, estruturou-se o ADF como instrumento de avaliação confiável e imparcial. A partir das pesquisas realizadas, concluiu-se que o material artístico espontâneo, produzido nas sessões com as famílias e com os pacientes psicóticos, ajudava os membros familiares e os psicoterapeutas a entenderem melhor os problemas familiares (Kwiatkowska, 1978).
As tarefas que compõem o ADF foram inspiradas em desenhos que apareciam naturalmente nas sessões de arte-terapia familiar. Observou-se que, ao desenvolvê-los, as famílias freqüentemente traziam temas em comum que estimulavam ricas discussões familiares. O ADF consiste na estruturação de seis tarefas realizadas em apenas uma sessão, com todos os membros possíveis da família, até mesmo a presença das crianças pequenas mostra-se importante para revelar segredos e a dinâmica familiar. Esta técnica permite obter também dados referentes às interações, separações, dominação, submissão, retraimento, dentre outros aspectos, de membros da família ou subsistemas. Para a realização dos desenhos, são utilizados cavaletes formando um semicírculo no setting, de modo que todos os membros da família possam ver os desenhos dos demais e comentá-los. Em cada cavalete há uma prancha com seis folhas de papel de tamanho 18x24 cm e uma caixa com lápis cera de cores variadas. Após cada etapa, pede-se à família para retirar a folha usada.
Em todos os desenhos deverão ser observados os comportamentos verbais e não verbais, as interferências feitas nos desenhos dos outros e a ordem de finalização dos desenhos (quem termina primeiro ou por último). A família é convidada a expressar-se livremente, é pedido para cada membro assinar, datar e dar um título às respectivas criações.
A seqüência das tarefas propostas por Kwiatkowska (1971, 1978) é a seguinte: (a) Primeiro desenho livre; (b) Retrato da família; (c) Retrato da família abstrata; (d) Rabisco individual; (e) Rabisco em conjunto; (f) Segundo desenho livre. Essa seqüência é de fundamental importância, pois cada tema pode provocar afetos intensos e estressantes, sendo trabalhados no desenho posterior, como por exemplo, na criação do Retrato da família abstrata, tarefa durante a qual o nível de ansiedade e estresse pode se intensificar. Por isso, logo após esta etapa, faz-se um exercício de relaxamento, pedindo aos membros da família que façam movimentos com os braços e criem um rabisco no ar, desenhando-o em seguida no papel.
De acordo com Kwiatkowska (1978), a primeira e a última tarefa foram inspiradas na técnica criada por Elionor Ulman, psiquiatra norte-americana que foi pioneira ao pesquisar sobre o uso da arte no diagnóstico psiquiátrico. O primeiro desenho, Primeiro desenho livre, é onde se registram as primeiras tensões do grupo familiar: pede-se que os membros da família "façam um desenho daquilo que vier à cabeça, que desenhem qualquer coisa que tenham vontade" (Kwiatkowska, 1978, p. 86).
O tema da segunda tarefa foi inspirado na freqüência com que os membros familiares desenhavam espontaneamente a família. O Retrato da família favorece discussão espontânea, quando é pedido a eles que "façam um desenho de sua família, cada pessoa, incluindo você mesmo" e que "façam um desenho da pessoa toda" (Kwiatkowska, 1978, p. 87). Nesse desenho, podem surgir várias perguntas relativas a quem incluir e como desenhar, devendo ser incentivado que seja criado da forma como a pessoa prefira. Ao terminarem, é solicitado que identifiquem cada membro desenhado.
Um momento que gera muita interação entre os membros da família é quando são solicitados a criar o terceiro desenho: Retrato da família abstrata. Esta tarefa é a mais difícil de ser explicada, e a que leva mais tempo para ser realizada, pois não é fácil de ser elaborada nem mesmo para as famílias mais integradas. Ela tem como objetivo colher informações simbólicas de cada membro. Pede-se que façam outro desenho da família, distinguindo cada membro, incluindo o próprio sujeito. No entanto, não devem desenhar rostos ou corpos, mas usar somente cores e formas para representar o que pensam ou sentem a respeito de cada membro da família.
De acordo com Touson (2002), médico e psicoterapeuta argentino, as cores representam uma forma idônea de se conhecer o inconsciente e o mundo interior do sujeito. Ele justifica a importância das cores devido a sua presença em tudo que nos é visível. Elas são portadoras de conteúdos e significados complexos, que vão além da escuta e da observação sobre a representação do objeto. Desde a escolha da cor até a intensidade do traço, pode-se analisar a expressão espontânea das emoções do sujeito. A partir das considerações deste autor, pode-se afirmar que o uso de cores e formas, na terceira tarefa do ADF, é bastante adequado para representar abstratamente cada membro da família.
O Rabisco individual é a quarta tarefa e oferece uma avaliação individual de cada membro familiar. Solicita-se que façam um rabisco no ar, depois desse movimento livre, solicita-se que cada um fique diante de sua folha, feche os olhos e faça o mesmo tipo de rabisco no papel. Depois do rabisco feito, pede-se que olhem o rabisco e vejam que imagem parece emergir deste, desenhando-a em seguida.
O clímax de ansiedade do grupo familiar se dá no quinto desenho, Rabisco em conjunto, quando são dadas as mesmas instruções do rabisco individual, mas com uma diferença. Solicita-se ao grupo que escolham o rabisco e criem um desenho em conjunto. É importante o mínimo de interferência do psicoterapeuta, com o objetivo de deixar a família muito à vontade. Nesse desenho é solicitado que decidam também o título e a forma de assinarem juntos.
Por fim, o último desenho solicitado, Desenho livre, tem como objetivo a redução da ansiedade do grupo, finalizando da forma que foi começada a técnica. Todavia, existe uma diferença entre o primeiro e o último desenho livre, visto que a criação do último é realizada após a mobilização de afetos intensos. Ele oferece dados de como a família se expressa após momentos de estresse e ansiedade.
Na sessão seguinte deve-se realizar a "devolução" dos dados recolhidos nos desenhos de cada um. Deve-se, junto com a família, entender os significados simbólicos de cada desenho e interpretá-los. Devido à espontaneidade do desenho, as figuras normalmente expressam sentimentos inconscientes e pensar sobre elas é de alguma forma trazê-los à consciência.
Em sua prática clínica com desenhos, Touson (2002) observou que o ato da criação consiste em três momentos: o da expressão, o da contemplação e o da elaboração. O da expressão ocorre no momento da criação do desenho. A contemplação ocorre a posteriori, quando a pessoa tem a oportunidade de examinar e considerar com atenção o objeto expressado, reconhecendo-o como próprio e único. O último momento o da elaboração envolve a resposta e o insight do sujeito ao que foi expressado no papel e também contemplado.
Pode-se pensar nestes três momentos da criação, observados por aquele autor, e correlacioná-los com o ADF. Não seria impróprio afirmar que estes momentos estão presentes na aplicação e na sessão de "devolução" deste instrumento. Na primeira sessão de criação dos desenhos, ocorrem os momentos de expressão e contemplação. Este último envolveria a contemplação familiar em relação aos desenhos de cada membro. Etapa importante de ser observada, pois envolve o "olhar familiar" sobre seu próprio sistema.
Na sessão de "devolução" ocorre a re-contemplação e elaboração conjunta sobre os desenhos. A divisão didática proposta por Touson (2002) ajuda a pensar, de forma minuciosa, sobre a riqueza e coerência do ADF; sendo fundamental não só aplicá-lo, mas também interpretá-lo junto à família. O psicoterapeuta, durante a sessão de "devolução", incentiva a família a perguntar algo que gostaria de saber sobre os desenhos uns dos outros. Além disso, incita a família a pensar sobre o simbolismo das figuras desenhadas. As interpretações do psicoterapeuta são feitas somente depois de oferecer este espaço de reflexão para a própria família (Kwiatkowska, 1978).
Ainda na sessão de "devolução", aquela autora recomenda ao psicoterapeuta comparar o primeiro desenho com o último, com a finalidade de analisar como os membros da família se expressaram após passarem por um alto nível de estresse e ansiedade na sessão. Segundo a autora, são os dois desenhos livres que geralmente expressam mensagens mais importantes. A aplicação deste instrumento tem a particularidade de trazer à superfície assuntos que dificilmente seriam discutidos no início de uma psicoterapia, justamente pela possibilidade de o desenho representar os conteúdos inconscientes. Assim, o ADF, como instrumento de avaliação, não só contribui com dados significativos sobre a dinâmica familiar para o processo psicoterápico, mas também acelera a construção da demanda e a adesão ao tratamento



http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-863X2008000300011